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Esqueleto de dinossauro de Atouguia da Baleia resolve antigos mistérios na paleontologia

diossauro de atouguia

Um esqueleto quase completo de um dinossauro descoberto há 60 anos na Atouguia da Baleia, resolve, segundo uma investigação científica, dois mistérios sobre dinossauros estegossauros: ‘Miragaia’ é um género válido e uma espécie descoberta muito antes na América do Norte é, na realidade, mais aparentada a espécies europeias. Francisco Costa e Octávio Mateus, paleontólogos da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa e colaboradores do Museu da Lourinhã, descreveram na revista científica ‘PLOS ONE’ um novo espécime, excepcionalmente completo, do dinossauro estegossauro ‘Miragaia longicollum’, do Jurássico Superior, de Atouguia da Baleia, o concelho de Peniche. Em comunicado enviado ao ALVORADA, os dois investigadores sublinham que “este espécime recentemente descrito, propriedade do LNEG -Laboratório Nacional de Energia e Geologia, é o estegossauro mais completo descoberto na Europa e o dinossauro mais completo descrito de Portugal. Este é revelador quanto a várias partes do corpo de esqueleto da espécie previamente desconhecidos, especialmente da metade traseira do esqueleto, ajudando a resolver muitos dos seus mistérios científicos”. O estegossauro de Atouguia da Baleia estará em breve exposto em posição de vida no Museu Geológico do LNEG, em Lisboa, como resultado de um projecto desta instituição, em parte financiado pelo Parque dos Dinossauros da Lourinhã.

Este novo esqueleto foi encontrado em 1959 por Georges Zbyszewski, enquanto realizava levantamentos de geocartografia para os Serviços Geológicos de Portugal, e desde então ficou guardado em reserva no LNEG, até que, em 2015, Francisco Costa começou a o estudar como o tópico principal de tese de Mestrado em Paleontologia, sob coordenação do investigador lourinhanennse Octávio Mateus. Durante este estudo, este esqueleto com 152 milhões de anos foi completamente preparado no LNEG, onde Francisco Costa beneficiou duma bolsa de investigação financiada por esta instituição pública para desenvolver este projecto.

Os ‘Estegossauros’ são dos dinossauros mais icónicos, melhor conhecidos pelo género ‘Stegosaurus’, mas os seus fósseis são dos mais raros do mundo, fazendo deste grupo um dos mais misteriosos entre os dinossauros conhecidos. “Em Portugal e Espanha, no entanto, a situação é diferente: ‘estegossauros’ da pequena subfamília ‘Dacentruriane’ são alguns dos dinossauros mais comuns e com mais distribuição”, afirma Francisco Costa. Esta subfamília foi descoberta na Inglaterra na década de 1870, com parte do esqueleto traseiro dum dinossauro chamado ‘Dacentrurus armatus’. Na década de 1990, a metade frontal dum esqueleto foi encontrado no concelho da Lourinhã, que levou em 2009 ao baptismo da nova espécie de estegossauro ‘Miragaia longicollum’. “Dado que estes, os espécimes de referência de ambas estas espécies, estão apenas parcialmente completos, com material de possível comparação limitado, isto levou os paleontólogos a regularmente discutirem a validade de ‘Miragaia longicollum’ como espécie e a classificação dos variados ‘dacentrurinos’ conhecidos na Europa”, destacam os investigadores. O ‘Dacentrurus’ era conhecido pelos membros posteriores e cauda, enquanto que o ‘Miragaia’ era conhecido pelo pescoço, cabeça e membros anteriores. As duas espécies não podiam ser comparadas adequadamente até hoje.

Para resolver esta situação, o espécime recentemente descrito, o ‘dacentrurino’ mais completo conhecido, tem servido de ‘Pedra de Roseta’, dado que ele inclui tanto um esqueleto frontal como um traseiro. Este permitiu confirmar que o ‘Miragaia longicollum’ é uma espécie válida e distinta, baseado em 29 características morfológicas distintas.

Este espécime também permitiu uma descoberta adicional inesperada, segundo os investigadores, resolvendo um enigma com mais de um século de idade sobre um dos estegossauros mais misteriosos: ‘Alcovasaurus longispinus’ do Jurássico Superior do Wyoming, nos Estados Unidos da América, conhecido pelos seus espinhos caudais excepcionalmente longos. Só um espécime foi encontrado, em 1908, que foi destruído por uma inundação na década de 1920, só sobrevivendo algumas ilustrações dos seus ossos fósseis. A posição deste animal na árvore da vida manteve-se um mistério desde então, até que várias características osteológicas partilhadas com o espécime português, principalmente na cauda, revelaram que esta espécie americana é de origem europeia e com parentesco próximo do ‘Miragaia longicollum’. “Isto permitiu reclassificar a espécie e com a nova combinação do ‘Miragaia longispinus’, dados os fortes indícios que ela pertence ao género ‘Miragaia’. Isto comprova a presença de um novo grupo de dinossauros na América do Norte”, afiançam Octávio Mateus e Francisco Costa.

O estudo deste espécime e de outros estegossauros europeus continuará na investigação de doutoramento por Francisco Costa, sob coordenação de Octávio Mateus. “MG 4863 é uma adição de valor inestimável ao registo fóssil português, contribuindo largamente para melhor compreender tanto o ‘Dacentrurinae’ como estegossauros num todo, os paleoecossistemas do Jurássico Superior na Europa e trocas através do proto-Oceano Atlântico Norte com a América do Norte”, garante Octávio Mateus, um dos autores que baptizou e primeiro descreveu o dinossauro Miragaia.

Como é um estegossauro dacentrurino? Os estegossauros são dos animais pré-históricos mais icónicos, facilmente reconhecidos entre outros dinossauros herbívoros quadrúpedes pela fileira dupla de placas e espinhos que os adornam desde a pequena cabeça até à ponta da cauda. Estegossauros dacentrurinos são, mesmo entre estegossauros, particularmente enigmáticos e únicos, evidenciando os espécimes de Miragaia pescoços excepcionalmente compridos, espinhos caudais de lâmina dupla com recorde de comprimento, músculos dos braços particularmente vastos e caudas especializadas com capacidades de chicote.

Texto: ALVORADA
Ilustração: Direitos Reservados