Ninho de Paimogo: paleontólogos portugueses e espanhóis desvendam mistérios da reprodução dos dinossauros jurássicos
- Categoria: Lourinhã
- 11/06/2024 12:49
Um grupo multidisciplinar de universidades de Portugal e Espanha estudou um dos fósseis mais emblemáticos de Portugal - um ninho com mais de 80 ovos de dinossauro -, revelando como os dinossauros nidificavam há 152 milhões de anos. Descobertos nos anos 90, os ovos com embriões de Paimogo são, segundo refere um comunicado do Museu da Lourinhã, “um dos fósseis mais emblemáticos de Portugal”. O estudo, realizado por paleontólogos portugueses e espanhóis utiliza técnicas das áreas da mineralogia, tectónica, sedimentologia, geoquímica e paleontologia para caracterizar este fóssil, e permitiu perceber como os grandes carnívoros do Jurássico construíam os seus ninhos e como as catástrofes naturais os destruíam.
O ninho de Paimogo é uma acumulação de quase uma centena de ovos de dinossauros ‘terópodes allosauroideos’, provavelmente pertencentes à espécie ‘Lourinhanosaurus’. Alguns destes ovos contêm exemplares dos embriões de dinossauro terópode mais antigos do mundo. Descoberto e descrito nos anos 90 do século passado pelo casal de paleontólogos amadores Isabel e Horácio Mateus, trata-se de um dos fósseis mais emblemáticos de Portugal, tendo recentemente sido cunhada uma moeda comemorativa de cinco euros dedicada a este exemplar.
A nova investigação, liderada por Lope Ezquerro e dirigida por Miguel Moreno Azanza, ex-membros da Faculdade de Ciências da Terra da Universidade Nova de Lisboa e agora professores de Estratigrafia na Universidade Complutense de Madrid e Paleontologia na Universidade de Saragoça, “pretende responder à pergunta se uma única fêmea poderia ter dado origem a uma acumulação de quase uma centena de ovos”, refere o comunicado. Dadas as características do exemplar, formado por uma acumulação desordenada e sem estruturas de nidificação aparentes, “a equipa abordou o estudo de forma marcadamente multidisciplinar, realizando estudos sedimentológicos, paleontológicos, geoquímicos e de paleomagnetismo, com o objectivo de aprofundar os processos que levaram à formação deste fóssil singular”.
A evidência paleontológica e geoquímica sugere que a acumulação inclui ovos de, pelo menos, duas fêmeas diferentes, embora tenha sido impossível determinar se os ovos foram postos ao mesmo tempo ou em temporadas de nidação sucessivas. Por outro lado, os estudos sedimentológicos e paleomagnéticos concluíram que os ovos “foram arrastados e acumulados por uma inundação causada pelo transbordo de um rio próximo”, que destruiu várias posturas de diferentes origens e as transportou, acumulando-as numa área próxima, onde os ovos ficaram presos entre a vegetação. Este processo, refere o Museu da Lourinhã, “acarretou a morte de várias das crias ainda dentro do ovo, que resultaram nos fósseis de embriões, únicos no mundo”.
O trabalho tem implicações sobre as estratégias de nidificação deste grupo de dinossauros carnívoros, entre os quais se encontra o ‘Allosaurus’. A reconstrução desta acumulação sugere que os allosauroideos nidificavam em montículos de terra ou plantas, construídos sobre o solo, como fazem algumas aves e outros terópodes mais modernos, e não em buracos escavados como outros dinossauros.
No comunicado é referido ainda que a principal contribuição desta colaboração luso-espanhola “é que estabelece um precedente de como devem ser analisados os possíveis ninhos de dinossauro para confirmar a sua identidade”. Esta é a primeira vez que paleontólogos, sedimentólogos, geoquímicos e geofísicos trabalham em conjunto para entender melhor uma possível estrutura de nidificação, abrindo a porta para reinterpretar acumulações de ovos de dinossauro de todo o mundo.
Os ovos de Paimogo podem ser visitados na exposição do Museu da Lourinhã, incluída no Parque dos Dinossauros da Lourinhã, o maior parque de atracções sobre fauna extinta da península. Além disso, uma pequena exposição dedicada aos resultados desta investigação pode ser visitada na sede do novo Geoparque Oeste, no Município do Bombarral. “Este novo estudo confirma que a Península Ibérica é um dos locais mais ricos em ovos de dinossauro do mundo, contando com jazidas únicas como as do Jurássico português, que se juntam a megajazidas de ovos de dinossauro do final do Cretácico recuperados na Catalunha, Castela-Mancha e Aragão”, explica a instituição lourinhanense tutelada pelo GEAL. Além do Museu da Lourinhã, este registo pode ser visitado no Museu Paleontológico de Castela-Mancha, em Cuenca, no centro Dinosfera, em Coll de Nargó, Lleida, e no Laboratório Paleontológico de Loarre, em Huesca, onde colaboram actualmente os autores do presente estudo.
O estudo foi realizado por uma equipa da Universidade Nova de Lisboa, em colaboração com as universidades de Aveiro e Saragoça. A investigação decorreu durante quatro anos e foi financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia de Portugal, através dos projectos XTalEggs e GeoBioSauria (PTDC/CTA-PAL/31656/2017 e PTDC/CTA-PAL/2217/2021) e a unidade de I&D Geobiotec.